Fullcover

Grupo QBE

“O negócio da QBE ganha vida quando falamos do cliente. As pessoas dizem que é a razão da nossa existência”

John Neal
A QBE tem operações com uma dimensão internacional há mais de 113 anos. Hoje está presente em 37 países, empregando 14 500 colaboradores. A FULLCOVER falou com John Neal sobre a forma como a empresa evoluiu e cresceu enquanto segurador global, sobre a importância da cultura e da diversidade e sobre o que leva um inglês, que agora vive na Austrália, a trabalhar no mundo inteiro e a ter uma paixão por Portugal.


A QBE passou por um processo de simplificação e reposicionamento das suas operações internacionais. Pode falar‑nos mais sobre a QBE de hoje, a filosofia, as competências e as ambições da empresa? De que modo estes aspetos se alteraram desde que a empresa foi fundada, há 130 anos?
A nossa atividade sempre teve um cariz internacional. Em 1904 foi inaugurado um escritório na Fenchurch Street, em Londres, e alguns dos escritórios na Ásia têm mais de 100 anos. Crescemos acentuadamente durante os anos 80 e 90 do século XX e no início deste século através de aquisições; num período de 25 anos, fizemos 150 aquisições. Este crescimento levou à constituição efetiva de uma companhia de seguros internacional.
Nos últimos quatro anos temos vindo a tentar definir, de forma clara, o valor que uma companhia de seguros global, em contraste com uma de cariz internacional, deve apresentar, focando‑nos onde queremos estar e onde não queremos. Isto tem tudo a ver com a nossa cultura empresarial, a nossa visão e os nossos valores, bem como com a forma como os nossos clientes nos veem e como os nossos profissionais pensam e sentem a empresa. Por isso, de alguma forma, o nosso legado tem sido útil. É ótimo termos uma pegada tão grande, sermos capazes de atuar no mundo dos seguros e não estarmos limitados pela geografia ou pelo produto.
Mas é igualmente difícil interiorizar esta visão e questionarmo‑nos sobre como devemos pensar e agir enquanto segurador global. Nada do que fazemos no setor segurador é complicado, mas sim complexo. Os mercados são diferentes e cada um tem as suas próprias perspetivas. Conseguimos olhar para os seguradores globais através de uma ótica especial. Na verdade, conseguimos vê‑los na ótica do cliente e perguntar: qual a vantagem para o cliente de sermos globais? Também podemos olhar para esta questão a partir de uma perspetiva de diversidade, de desenvolvimento para os nossos colaboradores.
Por outro lado, sou uma daquelas pessoas que não acredita numa gestão global do produto. Creio que as geografias são diferentes. Sim, o seguro de patrimoniais e de responsabilidade civil é o seguro de patrimoniais e de responsabilidade civil, mas a forma como é traduzido e distribuído pode ser muito distinto em diferentes áreas geográficas, e penso que temos de respeitar esta diferença.
Por isso, para mim, o importante é ter uma capacidade global que seja transversal à organização, mas com uma base exclusiva de distribuição local; o produto final terá de ser este. Foram quatro anos interessantes, uma espécie de reconstrução da empresa para se tornar global.
A QBE marca presença em todos os grandes hubs de seguros do mundo. Podemos dirigir‑nos ao corretor e aos seus clientes com legitimidade e dizer: se tiver interesses multinacionais, nós temos a capacidade de negociar a esse nível.
A nossa pegada em mercados emergentes estende‑se a 22 países na Ásia e na América Latina, o que é diferente e difícil. Se disser que uma das vantagens de ser global é a capacidade de tradução de um modo uniforme, então a geografia traz complexidade. Se estabelecermos uma capacidade multinacional em Londres, estaremos a fazê‑lo através da ótica de um país. Se o fizermos nos nossos mercados emergentes teremos de o fazer diversas vezes. Mas penso que seríamos ingénuos se geríssemos o nosso negócio a pensar no curto prazo. Temos de o gerir pensando a longo prazo, o que implicará o sucesso dos mercados emergentes.
Os nossos três mercados mais desenvolvidos têm aproximadamente a mesma dimensão. Subscrevemos aproximadamente 5000 milhões de dólares australianos no Reino Unido e na Europa, com um grande enfoque no mercado londrino, e 5000 milhões de dólares australianos na América do Norte e o mesmo valor no nosso mercado australiano e neozelandês.
Temos uma quota de 30% do mercado comercial da Austrália. Somos uma marca de excelência e renome, o que nos confere uma grande responsabilidade social.
Temos de ser prudentes na forma como nos posicionamos e estar perfeitamente cientes da proposta de serviço que apresentamos ao cliente, bem como daquilo que representamos. E isto implica um conjunto de diferentes desafios.
Mas sinto que a atividade da QBE está bem constituída. A nossa distribuição nos diferentes mercados é exatamente a que pretendemos, pelo que, a meu ver, a diversidade por área geográfica e por produtos permite‑nos ser consistentes no que respeita às expetativas dos nossos acionistas e dos nossos clientes.


Os mercados globais continuam a ser um desafio a vários níveis e, num contexto em que a «tradicional» definição de preços do risco já não se processa em ciclos definidos, de que forma é que a QBE assegura que os seus preços e processos de seleção de riscos respondem a estes aspetos mantendo‑se lucrativa?
Nos meus 30 anos no ramo dos seguros, nunca vi os preços numa situação tão desafiante como a de hoje. 
A situação que enfrentamos é difícil. A equipa da QBE é hiperdisciplinada na forma como trabalha. Conseguimos maturar esta abordagem à medida que passávamos pelo processo de decidir o que queríamos ser. Somos muito fortes na definição de preços de referência e de preços técnicos, e no entendimento da forma como empregamos o capital e o que isso significa, e a equipa fez isso muito bem num momento difícil do ciclo.
Há algumas coisas que temos de fazer em termos de negócio para gerirmos adequadamente a nossa organização. Mas, em última instância, o que estamos a fazer é facilitar o crescimento. Isto pode ser difícil em determinados momentos do ciclo mas se conseguirmos fazê‑lo estamos no caminho certo. Penso que se se verificar uma mudança no macroambiente, por exemplo, assim que se perceber de alguma forma que as taxas de juro podem vir a aumentar, o modelo muda e a margem de manobra pode passar a ser um pouco maior. Qualquer mudança nos preços dar‑nos‑ia a capacidade de crescer muito rapidamente. Depende de onde operamos.
No mercado de multirriscos habitação da Austrália, vimos a inflação atingir as indemnizações pela primeira vez em provavelmente duas décadas, na sequência da desvalorização da moeda – é uma economia de importação pelo que todos os custos aumentaram, o que se refletiu nas indemnizações. Acho que é isto que vamos ver no Reino Unido depois do Brexit, já estamos, aliás, a notar alguns movimentos no segmento do seguro automóvel.
Na Austrália podemos mudar os preços. Vimos uma mudança do negativo para o positivo em apenas seis meses. Podemos jogar a carta dos preços mais altos para compor as coisas. É um pouco mais difícil no Reino Unido. Como disse Steve Hearn da Ed, a única coisa que fez o mercado mudar nos últimos 30 anos foram os eventos extraordinários. Infelizmente, o mercado continuará neste marasmo até que algo aconteça. A meu ver, será preciso um evento de monta para mudar o mercado.
As nossas perspetivas são as de que a QBE pode crescer, mas a um ritmo relativamente nominal de cerca de 3% por ano, no segmento de topo. Este crescimento será alimentado por dois aspetos: os mercados emergentes, onde o crescimento é favorável, de cerca de 11%, e através de um enfoque real na retenção de clientes.
Fora destas áreas, temos de ser inteligentes no que respeita à gestão de capital e de tesouraria, e ser contidos na gestão operacional da atividade, temos de nos certificar que as indemnizações pelos sinistros são pagas de forma adequada ao cliente certo e que somos determinados perante os desafios. Por vezes as pessoas não percebem que se trata de uma questão de redução de custos. Gastámos 365 milhões de dólares a constituir os nossos centros de serviços nas Filipinas e fizemo‑lo para criar maior eficiência e escalabilidade na atividade da empresa. É assim que vemos as coisas.


As necessidades dos clientes globais estão em evolução, pelo que ser capaz de responder às suas exigências é crucial para os corretores. De que forma evoluíram as necessidades dos clientes e como são as potencialidades de serviço da QBE capazes de apoiar os corretores na resposta a estas exigências?
Penso que as empresas bem‑sucedidas são cada vez mais multinacionais; seja através de importações ou exportações ou da presença física de pessoas em diferentes países.
Parte da nossa solução consiste em termos mais expertise na utilização da tecnologia para apoiar os corretores e os seus clientes. Para uma empresa multinacional tudo se torna mais complexo quando começamos a emitir apólices em várias geografias, sobretudo devido a aspetos relacionados com a fiscalidade e a obtenção de licenças. Queremos que o corretor e o cliente vejam o que se está a passar. Por isso, construímos os nossos sistemas de maneira a permitir que ambos sejam capazes de ver estas áreas, desde o modo como as várias apólices se conjugam até ao estado do processo de indemnização. Isto cria velocidade de acesso, transmitindo a confiança de que, apesar da complexidade do negócio, existe clareza em todos os aspetos, desde a conformidade em termos jurisdicionais até à consistência na política de indemnizações.
Do ponto de vista da nossa proposta de subscrição temos de ser um pouco mais unidos na forma como abordamos o cliente, nem tudo passa pela subscrição. O responsável pela relação com o corretor deve ser escolhido em função das necessidades deste. Isto significa que pode ser um subscritor ou um especialista em sinistros ou ainda um analista de riscos. Estamos disponíveis para escolher a solução que dê a resposta mais adequada e mais pertinente ao corretor e ao seu cliente.
Isto é importante para todos nós, porque, quanto mais capazes formos de proporcionar serviços de qualidade, seja no âmbito da corretagem ou da subscrição, mais tempo manteremos o cliente e mais valioso ele se tornará para nós. Haverá uma maior confiança e um melhor entendimento pelo que penso que, na verdade, podemos atingir uma margem mais confortável quer em termos de corretagem quer em termos de subscrição.


A QBE centrou‑se na estabilização das operações na América do Norte. Quais as oportunidades que têm em vista para o crescimento de segmentos de especialidade nesta região?
A América do Norte foi interessante para nós porque tínhamos um foco muito claro para a nossa atividade na região. Depois, por volta de 2008, tornámo‑nos muito expansivos nas nossas aquisições. Passámos de 300 colaboradores num escritório para 3000 em quase 100 locais, no exato momento em que o mercado se tornou mais exigente. Demos um passo maior do que aquele que queríamos dar, pelo que, para nós, a América do Norte representou um momento fundamental em que repensámos a nossa atividade.
Reduzimos o nosso mercado aos segmentos de PME’s, corporate e de seguros de especialidade, onde entendemos que temos uma marca forte e reconhecimento, e reestruturamos a nossa atividade por forma a posicionarmo‑nos nesses setores de mercado. As nossas competências, os nossos clientes e os nossos corretores estão em sintonia.
Adotamos a forma como os corretores trabalham nos EUA assumindo uma perspetiva regional. Estabelecemo‑nos nos principais centros com um entendimento muito claro do ambiente e dos segmentos de mercado em que queríamos estar presentes.
Embora o mercado norte‑americano seja complexo do ponto de vista da regulação e arcaico no que toca aos processos, é um mercado inovador e rápido a aderir a novos produtos. Assim que compreendemos o mercado, entramos no seu ritmo, o que o torna mais estável e previsível em muitos aspetos.
Atualmente subscrevemos cerca de 5000 milhões de dólares americanos e, provavelmente, seremos capazes de subscrever entre 5000 e 8000 milhões. Se nos focarmos nos maiores corretores, nas empresas de wholesale e nas empresas super‑regionais, podemos ter uma interação relevante com elas e, não obstante a escala total do mercado, desempenhar um papel importante.
Penso que, neste momento, o nosso negócio na América do Norte é bom – e temos ainda alguns anos para melhorar a nossa margem.


A QBE conseguiu um forte crescimento na América Latina na primeira metade de 2016. Considera que, de entre os mercados emergentes, este continuará a ser um mercado‑chave no futuro? E qual o papel da Ásia?
Se olharmos para a atual atividade da QBE, 15% do que fazemos é em mercados emergentes, e este valor divide‑se de forma equivalente entre a Ásia (sobretudo o sudeste asiático) e a América Latina.
A América Latina é importante para nós; representa cerca de mil milhões de dólares australianos de receita em prémios. A meu ver, é um mercado muito mais difícil para nós do que o da Ásia. Temos de lidar com desafios económicos aos quais não estamos habituados. Por exemplo, quem dirige uma empresa na Argentina vê a massa salarial duplicar de três em três anos, porque a inflação salarial é de 30%. Trata‑se de um desafio quer no que se refere à gestão dos custos de funcionamento de uma empresa, quer no que diz respeito à vertente dos sinistros, porque o mesmo fator inflacionário afeta os custos com indemnizações por sinistros. A dinâmica de gestão de uma empresa nesta região é muito diferente. Os produtos de seguro de especialidade ainda não arrancaram realmente nesta região, pelo que temos de olhar para os seguros para particulares e para empresas. Isto significa que as economias em si constituem um desafio, mas entendemos  que vale a pena investir. Tivemos a sorte de estar na Ásia desde muito cedo. Não tivemos de fazer aquisições para entrar no mercado nem tivemos problemas com parceiros de joint‑ventures como outros players tiveram. Por isso, o ritmo do negócio é mais fácil e o retorno é maior. O crescimento é um desafio; os mercados de Hong Kong e Singapura são dos mais competitivos do mundo. As pessoas pensam que a Ásia é um mercado fácil, mas isso não é verdade. Trata‑se de um mercado importante para nós e no qual estamos muito focados.


Enquanto segurador internacional, a diversidade e a inclusão são indubitavelmente importantes áreas de enfoque. De que forma asseguram que estas se refletem e que são adotadas em todos os níveis de negócio e no interface com os clientes?
Um dos aspetos estimulantes de gerir uma empresa global é a abordagem da diversidade – na QBE a diversidade existe quase como fator inerente à nossa existência –, que é o que a empresa procura realmente atingir. Precisamos de diferentes culturas e formas de pensar ‑ dois fatores que trazem inovação para o negócio. Se todos pensarem como eu, então temos um problema! O mundo em que atuamos não é um mundo de semelhanças e isto serve para qualquer geração.
Para mim foi interessante mudar‑me para a Austrália, onde a questão do género está muito presente. Não que esta questão deva depender de quotas, o que nem sempre ajuda muito, mas o facto é que estas quotas já existem há sete ou oito anos no país. Nos bancos, apercentagem de colaboradoras será de 40%, na nossa sede, em Sidney, é de 35%.
Porque esta tem sido uma das nossas áreas de foco pensamos no valor que nos aporta. O nosso conselho de administração reúne‑se em todo o mundo — tal como o da Brokerslink – e perguntam‑me se é diverso. Embora possa não representar uma diversidade de género tão significativa quanto a que queremos (atualmente 25% da nossa administração é do sexo feminino), temos membros de nacionalidade americana, britânica, chinesa de Hong Kong, alemã e brasileira, pelo que se alguém pensar por algum momento que o nosso conselho de administração não reflete uma diversidade de pensamento, é melhor pensar de novo.
Mas eu creio que é interessante olhar para a diversidade face ao desenvolvimento dos diferentes negócios. Se falar com os representantes da nossa empresa na América Latina sobre diversidade, eles ficarão intrigados e a pensar nas razões que o terão levado a falar sobre isso. Tem que ver com a forma como as empresas funcionam naquela região.
Penso que são as empresas mais jovens que são mais diversas e inclusivas por inerência. Trata‑se da forma como são construídas. Nas empresas mais antigas e mais implantadas, o desafio é maior.
De certa forma, estando nós preocupados a pensar sobre como vamos dirigir‑nos à geração Y, deveríamos também pensar sobre como poderemos manter o conhecimento acumulado que as gerações mais velhas representam. A QBE criou um programa de orientação invertido, que junta um colaborador mais jovem e menos experiente a um mais velho e mais experiente, sendo o primeiro o mentor, que partilha o seu conhecimento especializado com o segundo. Naturalmente, as duas extremidades do espectro estão ligadas. Há com certeza aqui uma oportunidade para o nosso setor.
Outro fator importante de promoção da diversidade é pensar no desenvolvimento de talento a partir de uma base holística; se pensarmos de forma inteligente sobre o talento, criaremos diversidade. Infelizmente, se pensarmos em diversidade apenas em números, a situação torna‑se incómoda e deixamos de estar à vontade na empresa.
Chegamos a embarcar um pouco nessa onda, mas reconhecemos que tínhamos de ser prudentes. Temos atualmente uma discussão alargada acerca do talento.
E atuando desta forma as coisas entram nos eixos naturalmente. Como reflexo disto mesmo, o nosso grupo executivo costumava ser o nosso conselho de diversidade e inclusão, mas já não é; é o nosso conselho de talento.

Quais os atributos e competências fundamentais que os futuros líderes do setor segurador terão que ter para ser bem-sucedidos?
A primeira coisa que eu quero ver no líder do futuro é autenticidade. Quero ver uma pessoa de verdade e sentir que, a pessoa que vou ver, de forma consistente, todos os dias, é genuína. Depois, tem de ser inteligente; isto não significa que tenha de ter um doutoramento ou algo parecido, mas que tenha um interesse, algo que mostre que será capaz de enfrentar um problema de forma diferente.
Terá de ter muita energia e de ser inclusivo; sempre que tenha uma ideia ou um palpite deverá partilhá‑lo imediatamente; se pusermos uma ideia em cima da mesa e a desenvolvermos ela acaba por florescer.
Ter a capacidade de se importar com as coisas também é fundamental. Quando olhamos para os inquéritos sobre o envolvimento dos nossos colaboradores há dois aspetos importantes: a visão da empresa encontra acolhimento e as pessoas acreditam nela? E qual a importância que cada um lhe dá? Se conseguirmos que estes dois aspetos se verifiquem em qualquer organização, teremos um conjunto de trabalhadores em grande forma e a relação com o cliente será melhor.
A QBE espera que os seus líderes se adaptem, que tenham essa capacidade. Por exemplo, sinto que quando conseguimos convencer e apoiar os líderes no sentido de trabalharem em diferentes áreas geográficas e culturas, eles tornam‑se mais atenciosos e conscientes perante os outros, logo, mais tolerantes. Há formas inteligentes de o conseguir e admito que costumávamos ser poucos sofisticados na forma como o fazíamos.
Antes, poderíamos dizer: «Apareceu esta oportunidade em Singapura e tem de ir para lá. Aquilo que o espera cá quando regressar, nós não sabemos; vá e vamos ver o que o espera quando regressar.» Agora, podemos criar missões de seis semanas, três meses, um ano e até dois anos.
É uma grande oportunidade e a experiência adquirida é valiosa.


Qual considera ser o impacto que as grandes mudanças que temos vindo a sentir nos panoramas político, social e tecnológico terão nos seguradores e corretores globais nos próximos anos?
Penso que há uma voz interessante a fazer‑se ouvir no mundo. Seja o Brexit, o presidente Trump nos EUA, ou o que vimos em Itália e estamos prestes a ver na Alemanha e provavelmente também em França, os políticos têm de ouvir e tentar compreender estas preocupações. Penso que há uma oportunidade para nós (o setor segurador) de fazermos parte dessa voz.
Um facto pouco conhecido, penso eu, é que o montante total que as companhias de seguros dos ramos Vida e Não‑Vida controlam no mundo tem a mesma dimensão que os fundos que suportam pensões em todo o mundo.
Isto significa que controlamos um terço da capacidade de investimento mundial. Penso que nos encontramos perante a grande responsabilidade de termos consciência social, e não apenas consciência económica, e de pensarmos de forma um pouco mais ampla sobre alguns dos grandes temas que afligem o mundo e sobre o que podemos fazer para ajudar.
E isto funciona nos dois sentidos. Devemos envolver‑nos com os governos, talvez de forma mais eficaz do que no passado, e vice‑versa. Para mim, o que ajuda neste aspeto é que quanto mais unidos estivermos – estou a pensar na Brokerslink – quanto mais completa for a forma como nos apresentamos, maior é a probabilidade de sermos ouvidos.
A QBE vê o mundo de forma mais global no que respeita ao comportamento dos clientes. Podemos discutir o que se passa no mundo, a globalização e a imigração, mas é uma discussão totalmente diferente. No que respeita aos clientes, ser capaz de dizer «sim, podemos responder às suas necessidades» é muito importante.

Os modelos de corretagem também estão a mudar. Um exemplo disso é a transformação da Brokerslink, que passou de uma rede de corretores independentes a uma empresa de corretagem verdadeiramente global. Poderá este modelo desafiar as tradicionais estruturas de corretagem internacional e ser bem-sucedido?
Penso que, em última instância, o facto de os dois maiores corretores se terem tornado mais poderosos criou mais oportunidades para todos os outros corretores. Eles têm o poder de fogo e a capacidade de investimento em tecnologia e análises automáticas e fazem o seu trabalho muito bem, mas isso dá espaço aos restantes, que podem dar um toque mais pessoal à forma como negoceiam com o cliente e conhecê‑lo muito melhor. Podemos conhecer melhor um conjunto limitado de mercados e criar uma ligação mais forte e de maior confiança. Acho que esta é a oportunidade que temos à nossa frente.
Para mim, a Brokerslink ter‑se tornado uma empresa de corretagem global é uma oportunidade. Existe um imenso contingente de pessoas que quer ser considerado e tratado individualmente, que quer ter uma ligação real com o corretor que escolhe como parceiro e que quer sentir que pode ter uma maior proximidade com o mercado, de uma maneira mais pessoal, e que o seu negócio é tratado de forma individualizada. A Brokerslink pode recorrer a competências globais e fazer tudo o que lhe for pedido com uma maior ligação pessoal, estando portanto em vantagem. E, na verdade, para nós, enquanto subscritores, isso faz diferença. Se acharmos que um corretor compreende genuinamente o cliente que está a representar, então vamos estabelecer o preço do risco em conformidade.
A «folha de papel» não nos permite conhecer o cliente, os números não nos dão a conhecer o cliente – é informação menos relevante e que não nos faz avançar.
Por isso, o que a Brokerslink nos pode oferecer, com o conhecimento mais próximo do cliente que têm, é informação que nos alavanca. Se a subscrição se basear apenas na matemática, vamos perder dinheiro, porque, em geral, o mercado estabelece níveis de preços mais baixos e todos cortarão nos preços. Posso dizer‑lhe como se estabelece o preço técnico de um risco mas quase nunca lá chegamos.
O importante é conhecer o cliente, e a melhor forma de o fazermos, e a forma como escolhemos fazê‑lo, é através do corretor. Penso que a capacidade que Brokerslink tem de conhecer o cliente com uma maior proximidade é importante para nós. Os corretores de maior dimensão, pelo contrário, têm de fazer as coisas sempre de uma mesma forma. Se a isto juntarmos as capacidades globais da Brokerslink, entramos num nível completamente diferente.


A disrupção assume muitas formas e o potencial impacto que tem no setor segurador está bem documentado. Como olha para a disrupção? Como uma ameaça ou uma oportunidade?
Penso que é importante para nós aceitarmos os disruptores e trabalharmos com eles. Em última instância, temos influência e capacidade no mercado, e eles trazem uma forma de pensar diferente e, provavelmente, novas tecnologias, pelo que se nos associarmos aos disruptores em vez de nos sentirmos intimidados por eles, criamos uma oportunidade, e é isso que estamos realmente a fazer na QBE. Com efeito, estamos prestes a organizar a nossa primeira «maratona de programadores» (hack‑a‑thon), para decidirmos quando e onde vamos investir o nosso dinheiro no que respeita ao apoio a disruptores. Para mim, tem que ver com a forma como canalizam a distribuição e como poderão distribuir os produtos de forma diferenciada.
No mercado de retalho está a ser feito um trabalho inteligente que se consubstancia em vender seguros sem fazer perguntas. A QBE está a trabalhar com um parceiro norte‑americano para verificar se, de facto, conseguirá subscrever seguros para empresas desta forma, e pensamos que sim, que será possível. Alguém tira uma fotografia das instalações que pretende segurar, digamos, uma loja. A fotografia tem imediatamente um código de GPS, pelo que sabemos exatamente onde se situa a propriedade. Podemos ter acesso a dados municipais; ver a construção da propriedade, a dimensão e o espaço. Depois podemos ir ao site da loja e ver que tipo de produtos vende, podemos aceder aos dados financeiros públicos, consultar os dados da Dun & Bradstreet.
Quando temos em conta estes dados, verificamos que, provavelmente, se trata de 50 a 60% mais informação do que a que poderíamos recolher fazendo perguntas. Há, pois, definitivamente, uma forma diferente de trabalhar no setor segurador.
Sempre tive uma espécie de obsessão acerca dos contratos anuais de seguro. Penso que se há coisa que nunca devia acontecer é a emissão de contratos de seguro anuais, mesmo para uma empresa. As empresas podem querer seguros que se alinhem com os ciclos de receitas. E porque não? Podem querer fazer um contrato sem termo.
Há muitos locais do mundo nos quais fazemos alguns dos mais complexos contratos de construção que existem atualmente no mundo; e terão a duração de 15 anos sem que alguém levante qualquer objeção.
Seguramos o Crossrail no Reino Unido (um dos maiores projetos de construção de caminhos de ferro e infraestruturas da Europa) e fazemo‑lo desde 2005. O projeto irá concluir‑se em 2017 com a ligação subterrânea de Londres. Segurámos a terceira pista do aeroporto de Hong Kong e a quarta extensão do aeroporto de Changi de Singapura. Mas não seguramos a casa de alguém por mais do que um ano. Porquê?
Se formos clientes de um banco, vamos querer alinhar o pagamento do seguro com o nosso ciclo de pagamentos, que poderá ser mensal ou quinzenal. Ou se quisermos pedir um empréstimo para comprar um carro e esse empréstimo tiver a duração de quatro anos, então iremos segurar o carro por quatro anos. Ora, temos de parar e pensar: porque não poderemos fazer o mesmo para qualquer seguro?
De certa forma, os disruptores são como uma variação na diversidade dos colaboradores. Não estão a fazer mais do que a levar‑nos a pensar de forma diferente, o que, em última instância, é positivo.

A evolução da Cooper Gay para a Ed atraiu as atenções. Juntamente com a nova marca, Steve Hearn, CEO da Ed, afirmou que a empresa está a redefinir a corretagem e a construir o corretor do futuro. Uma afirmação arrojada, mas será uma proposta realista?
Penso que o que Steve Hearn fez, muito inteligentemente, foi criar barulho em torno da Ed, o que, em última análise, era o objetivo. Temos de fazer barulho para «agitar as águas».
De certa forma, surpreendeu‑me o facto de o modelo wholesale de corretagem ter sobrevivido durante tanto tempo sem mudanças. Eu previa o seu fim nos anos de 1980, mas contínua pujante na atualidade. Mas penso que o mercado wholesale tem de ser reinventado. É manifesto para mim que existe valor num «corretor de corretores» com acesso a uma grande variedade de mercados e um entendimento mais amplo das oportunidades, é claramente uma mais‑valia. O que fizeram no passado é fundamental, mas agora tem de ser feito de forma mais eficiente. E isso é o que o Steve e a Ed estão a fazer.
O mercado Lloyd’s é um mercado wholesale, de subscrição e de partilha. Quando dizemos que a Uber e a AirBnB são a economia partilhada, deveríamos colocar o Lloyd’s na lista, e o Lloyd’s já o faz há mais de 300 anos. Não é bem uma ideia nova. O Lloyd’s, como qualquer negócio, tem de se reinventar para conseguir maior eficiência no modelo em que opera. É esse o nosso desafio. Alguns dos desafios foram‑nos impostos. A regulação, por exemplo, acrescentou um patamar de complexidade e custos ao negócio. Alguma é necessária, mas outra é completamente inútil.
Temos de encontrar uma forma de afastar alguns dos custos de atrito do nosso negócio. Este é, em última análise, o nosso risco de disrupção. Alguém há de aparecer e dizer «eu gasto um dólar e vocês dois tiram 35 cêntimos para dividir entre vocês e isso não me deixa satisfeito». É este o problema que temos de resolver. E penso que é o que o Steve está a tentar fazer.


A visão da QBE é a de ser o segurador que cria as parcerias mais fortes com os clientes. De que forma se manifesta esta visão nas atividades quotidianas da empresa?
O que é mais importante para mim é o ponto de vista do cliente e tudo começa com o corretor. Temos de ouvir o que tem para nos dizer. Não nos cabe apenas definir os nossos produtos e colocá‑los em cima da mesa. Temos de estar preparados para adaptar os nossos produtos por forma a que respondam à evolução da dinâmica do mercado.
Há pouco falei da forma como conduzimos a conversação cliente/corretor de forma a refletir o que é mais importante para eles. Outro exemplo seria o de Londres, onde subscrevemos aproximadamente 50% no papel do Lloyd’s e 50% no da QBE.
Somos completamente agnósticos no que respeita a estes mercados. A nossa visão, e a forma como conduzimos a nossa atividade, é a de termos subscritores com dupla acreditação poder atuar em ambos os mercados e alocamos a mesma quantidade de capital e o mesmo custo independentemente do papel que é usado. A decisão sobre qual o papel a usar num determinado risco será tomada apenas em função do cliente.


Num dos seus tweets diz que todas as organizações têm de compreender e divulgar os seus fins e o porquê da sua existência. Como definiria os fins da QBE?
As únicas duas coisas que eu acho que diferenciam os seguradores e os corretores são o que os nossos clientes pensam e dizem sobre nós e o que os nossos colaboradores fazem. É isto que, em última análise, nos distingue dos demais.
Quando pensamos sobre renovações, queremos começar o processo quase no dia a seguir ao da renovação da apólice – revendo o que correu bem e o que não correu bem. Se quisermos construir uma relação com o cliente, vamos trabalhar nas áreas que não correram tão bem e, então, a renovação seguinte correrá bem. Para mim, trata‑se de construir uma relação mais próxima com o cliente.
No que respeita às pessoas que trabalham connosco, trata‑se de nos assegurarmos de que estão preparadas para encetar esse tipo de conversação. Por um lado, têm de ter a capacidade técnica para cumprir a tarefa que lhes confiamos. Por outro lado, têm de ter a capacidade de criar uma relação com o cliente. Se não colocarmos
o cliente no centro da nossa visão, estaremos, de alguma forma, em apuros.
O negócio da QBE ganha vida quando falamos do cliente. As pessoas dizem que é a razão da nossa existência.


O apoio à comunidade e o patrocínio desportivo são parte do ADN da QBE. Porque são tão importantes para a empresa iniciativas como a Premiums4Good (por meio da qual 25% dos prémios de seguros são aplicados em investimentos sociais)?
A Premiums4Good (P4G) surgiu num dos nossos fóruns de liderança. Tivemos uma avaliação de ideias do tipo Shark Tank e houve três ideias que emergiram, sendo que a P4G foi uma delas. Na altura chamava‑se «Policy with a Heart».
No essencial, o que dizemos a alguém que nos compra um seguro é que investiremos 25% do prémio em estratégias de investimento socialmente responsável.
Investimos diretamente em projetos que trazem benefícios para as comunidades e para o ambiente e não em iniciativas genéricas de beneficência ou fundos ambientais. Poderão ser obrigações com impacto social, obrigações verdes ou obrigações relacionadas com energia e infraestruturas renováveis.
O processo é muito transparente e apresentamos ao cliente uma atualização anual dos investimentos para que compreendam os projetos que são apoiados e possam usar os dados nos seus próprios relatórios empresariais no que diz respeito ao desempenho em termos de responsabilidade social. O P4G tem um eco muito positivo em alguns setores de negócio, por exemplo, em empresas de consultoria e profissionais liberais. É também algo muito bom para os nossos colaboradores, algo que lhes confere um verdadeiro sentido de respeito pelas comunidades em que atuamos.
Em 2011 criámos a nossa própria fundação global. Tal como acontece com o grupo, funciona em cada uma das divisões geográficas: Europa, América do Norte, Austrália e mercados emergentes. Colocamos entre 0,5 e 0,6% dos nossos lucros anuais na fundação, ou seja cerca de 5 a 6 milhões de dólares australianos.
Em termos totais o fundo está repartido entre as duas divisões geográficas, sendo que cada uma tem um conselho gerido pelos colaboradores da empresa que decide a forma como os fundos são alocados. Embora trabalhem autonomamente, ambas acabaram por ter a mesma abordagem, o que é interessante. Cada uma escolhe uma instituição de solidariedade que pretende apoiar durante o ano, sendo o valor restante distribuído por um leque alargado de organizações. No total, ao longo do ano, apoiamos cerca de 300 instituições de solidariedade.
Enquanto CEOs, temos de ser prudentes e evitar excessos na estruturação destas oportunidades. Têm de ser conduzidas pelas pessoas da empresa. É uma questão de permitir que as pessoas façam o que é importante para elas. Penso que esta abordagem é muito mais interessante para os nossos colaboradores e para as comunidades onde temos operações do que apoiar uma única instituição de solidariedade.

Quais foram os pontos altos da sua vida profissional e pessoal durante os 13 anos na QBE?
Se tiver de escolher, escolho em primeiro lugar aquilo que conseguimos alcançar na nossa atividade no Reino Unido e na Europa. Juntos reunimos um conjunto esparso de negócios nestes territórios, unificámo‑los debaixo de uma única marca e apresentámos uma forte proposta de valor.
Em segundo lugar destaco o facto de ter passado pelo processo de reflexão no sentido de afirmar a QBE de forma inequívoca no mapa global. Foi algo que me entusiasmou muito.
Em terceiro lugar destacaria o talento. Criar a nossa própria academia de aprendizagem, desenvolver a nossa própria academia de subscrição foi ótimo. Acredito verdadeiramente que, a este respeito, estamos a investir no setor e não apenas na QBE.

Como relaxa e descontrai depois de um dia no escritório?
Para mim são as coisas simples da vida que fazem a diferença: boa comida, bom vinho, boa conversa. Penso que ter uma ampla base de amigos faz toda a diferença. Eles permitem‑nos sair do nosso próprio mundo.
Por isso, com um bom grupo de amigos juntos à volta da mesa, com uma boa refeição e um copo de vinho do Douro, o mundo é um lugar diferente. Esta é, para mim, a melhor forma de relaxar.
Os meus melhores amigos não têm nada que ver com seguros. Somos nós próprios com os amigos; não somos um crachá com o nome e isso é muito importante. A vida traz os seus próprios desafios e temos de ser cuidadosos, já que todos temos muitas coisas a acontecer nas nossas vidas ao mesmo tempo. O que faz a diferença é estarmos felizes e com os nossos amigos.

A FULLCOVER sabe que tem uma afinidade com Portugal. Pode dizer‑nos mais sobre a sua relação e interesse no país e nas suas pessoas, cultura, gastronomia e vinho?
É verdade. O meu local favorito é o Algarve.
Tudo começou quando lá estivemos com uns vizinhos nossos do Reino Unido que já eram visitantes habituais.
Pensámos logo que era um lugar perfeito. Acho que o Algarve tem mais dias de sol do que qualquer outra parte do mundo. Tem mar, pode‑se jogar golfe e é muito agradável.
Tenho uma casa na Quinta do Lago há 10 anos e tento ir lá três vezes por ano.
Há muito tempo que gosto do Algarve. É o sítio onde mais me sinto descontraído. Tem tudo o que eu valorizo – um clima maravilhoso e pessoas incríveis. Acho que os portugueses são simplesmente espetaculares. São acolhedores e de trato fácil. A comida e o vinho são simplesmente estupendos. Onde quer que esteja, procuro sempre encontrar vinho português na carta de vinhos: um vinho tinto, um bom vinho do Douro.
Gosto muito da oportunidade que o meu cargo me dá de conhecer locais e culturas diferentes que, de outra forma, não poderia conhecer. [John Neal passa pelo menos metade do ano a viajar pelo mundo]. No entanto, acho que ter viajado tanto acabou por fazer com que não me atraia a ideia de apanhar um avião no meu tempo livre para explorar uma selva profunda, ou algo do género. Acusam‑me de ser muito aborrecido, mas prefiro aproveitar Portugal, onde posso relaxar e sei com o que conto.
Apenas lamento falar tão mal português. Sou um verdadeiro desastre e sei que é um pecado grave. 
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